Wednesday, June 30, 2010

E-learning: Problemas em Aberto (1)

A evolução verificada no e-learning nos anos mais recentes, influenciada pelo desenvolvimento das redes de comunicação e pelas ferramentas sociais da Web 2.0, produziu já resultados. Há ainda diversas questões por resolver que são debatidas pela comunidade do e-learning. Algumas dessas questões são de natureza técnica, outras têm uma envolvente essencialmente pedagógica e de adaptação dos métodos de ensino e outras reflectem preocupações presentes na sociedade em geral.

Talvez a primeira questão a colocar seja o facto da informação, os factos conhecidos actualmente cujo número cresce exponencialmente, atingir uma dimensão tal que já não é possível lidar com essa informação da forma que foi seguida até final do século XX. Conhecer e memorizar um determinado conjunto de factos era suficiente para desenvolver as competências necessárias para desempenhar um papel útil numa sociedade essencialmente industrial (ver o post de Stephen Downes, An Operating System for the Mind). Era esse o papel dos sistemas de ensino. O que se passa actualmente é que os factos conhecidos são em número muito superior, mudam rapidamente, são facilmente acessíveis e em muitos casos chegam sem terem sido explicitamente pedidos ou procurados.

As competências exigidas actualmente são também mais vastas. Entre essas competências há uma que é essencial: a capacidade de filtrar a informação. Alguns factos são mais importantes do que outros e mesmo muitos deles podem não ser correctos. A capacidade de encontrar os factos relevantes será uma competência essencial e que poderá substituir a capacidade de simplesmente memorizar os factos relevantes. A memorização de factos continuará a ser importante, por razões diversas, mas a análise crítica desses factos, a capacidade de os relacionar e de agir de forma consequente será um factor crítico num mundo em mudança no qual valores dados por adquiridos por vezes deixam de o ser. A tecnologia é excelente em transmitir e apresentar a informação. A dificuldade é saber como filtrar essa informação e discernir o que é importante para ser aprendido e conhecido. Este será um desafio colocado a todos os intervenientes nos sistemas de ensino.

O excesso de informação poderá mesmo ser contraproducente. Esta preocupação está presente já na sociedade actual. Atente-se na afirmação seguinte do presidente dos EUA num discurso dirigido a estudantes universitários: "You're coming of age in a 24/7 media environment that bombards us with all kinds of content and exposes us to all kinds of arguments, some of which don't always rank all that high on the truth meter … With iPods and iPads and Xboxes and PlayStations - none of which I know how to work - information becomes a distraction, a diversion, a form of entertainment, rather than a tool of empowerment, rather than the means of emancipation." (ver este post).

Tuesday, June 22, 2010

Competências para o Século XXI

Para além das condicionantes impostas pela tecnologia, o futuro da educação e das ferramentas que auxiliarão os processos de ensino e aprendizagem, dependerão do que as sociedades exigirem no futuro. O que que se pretende que uma pessoa saiba, ou seja, qual será o significado de ser uma pessoa instruída no século XXI ? Quais as competências que serão exigidas e quais os melhores processos para as adquirir? Como é que uma sociedade ou comunidade se deverá preparar para competir num mundo global onde a informação é um bem de acesso livre? Qual deverá ser o posicionamento das instituições de ensino e qual será o papel dos professores?

As respostas às questões anteriores irão condicionar os processos de ensino e de aprendizagem, a organização das escolas, os currículos e, obviamente, as ferramentas de apoio aos processos de ensino e de aprendizagem. Os sistemas de e-learning, enquanto ferramentas de apoio ao ensino/aprendizagem evoluirão não só em função do desenvolvimento tecnológico mas também em função do que as sociedades considerarem que deve ser o processo de formação das pessoas que as constituem.

Na perspectiva de George Siemens saber algo é estar posicionado numa rede, de tal forma que seja possível o acesso imediato à informação que precisamos em diferentes contextos (“to know means to be positioned in a network in such a way as to have ready access to what we need in varying contexts.”). Para Alvin Toffler, os analfabetos do século XXI não serão aqueles que não souberem ler nem escrever mas aqueles que não souberem aprender, desaprender e voltar a aprender ("The illiterate of the 21st century will not be those who cannot read and write, but those who cannot learn, unlearn, and relearn.”). Estas duas perspectivas sintetizam duas ideias fundamentais: a informação deixou de ser um bem escasso e a chave será possuir as competências necessárias para aceder a essa informação, existente numa rede inteligente de conhecimento colectivo partilhado; por outro lado, a informação e o conhecimento evoluem a um ritmo muito rápido pelo que cada um de nós não poderá dar por adquirido para sempre o conhecimento que obtém num dado momento mas sim estar preparado para uma actualização permanente e para a busca de novo conhecimento ao longo da vida.

Tuesday, June 15, 2010

m-learning e o iPad

A computação móvel surge mencionada tanto no Horizon Report de 2009 como na edição de 2010 (ver este post). Na realidade verifica-se uma tendência para utilização em cada vez maior escala de equipamentos móveis. O m-learning é apontado por muitos (não há um consenso absoluto, havendo também quem preveja o seu fim) como uma das tendências futuras mais promissoras. Os equipamentos móveis são já muito mais do que os primeiros e simples equipamentos usados para comunicações de voz. O sucesso do lançamento de equipamentos como o iPad da Apple com uma adesão entusiástica de muitos utilizadores revela o potencial deste tipo de dispositivos. Com tão grande sucesso na sociedade em geral, a sua adopção no campo da educação deverá ser um passo natural e óbvio. Algumas instituições de ensino superior já estão conscientes deste potencial como é o caso da Seton Hill University que pretende distribuir estes equipamentos aos seus alunos (ver a figura abaixo) já no ano lectivo de 2010/2011. Como é óbvio, as aplicações já começaram a aparecer. As discussões sobre o uso do iPad no ensino também já estão aí (ver, por exemplo, Apple's iPad: What does it offer for e-Learning? ou Apple iPad Disappoints eLearning Industry). Uma das maiores desvantagens apontadas é o facto de não suportar Flash.

Sunday, June 13, 2010

Futuro do E-learning: Tecnologias Relevantes

O Horizon Report é um relatório anual produzido pela New Media Consortium e pela EDUCAUSE Learning Iniciative. A New Media Consortium é uma associação sem fins lucrativos de entidades ligadas ao ensino que estuda o uso de novas tecnologias. Os seus membros incluem um número significativo de universidades da América e Norte e algumas universidades europeias. A EDUCAUSE é também uma organização sem fins lucrativos, com sede nos EUA e membros espalhados pelo mundo. O relatório procura identificar tecnologias emergentes que possam vir a ter impacto no ensino. As tecnologias são analisadas numa perspectiva de curto prazo (um ano), de médio prazo (dois a três anos) e de longo prazo (quatro a cinco anos).

O relatório de 2010 refere as seguintes tecnologias e tendências com potencial para adopção no ensino:
  • Num horizonte de curto prazo – computação móvel e disponibilização aberta de conteúdos.
  • Num horizonte de médio prazo – livros electrónicos e realidade aumentada.
  • Num horizonte de longo prazo – computação baseada em gestos (gesture-based computing) e análise visual de dados.
No curto prazo, a computação móvel refere o uso para fins pedagógicos de dispositivos que muitos alunos já transportam consigo: computadores portáteis, smartphones ou iPods, por exemplo. O potencial destes equipamentos já foi discutido neste trabalho. O uso destes dispositivos móveis no ensino corresponde ao m-learning destacado no Horizon Report de 2010 e igualmente referido na edição de 2009. A título de exemplo e para ilustrar o potencial dos dispositivos móveis integrados com as plataformas de e-learning, destaca-se a aplicação mTouch para o iPhone da Apple. Esta aplicação permite o acesso e a interacção com cursos no LMS Moodle. A disponibilização aberta de conteúdos diz respeito à tendência de muitas universidades disponibilizarem livremente os conteúdos dos seus cursos on-line.

No médio prazo, os livros electrónicos e os equipamentos dedicados para a sua leitura são apontados como uma das tecnologias com grande potencial de aplicação ao ensino. A nível destes dispositivos a referência é o Kindle da Amazon. A realidade aumentada é igualmente referida com potencial elevado no horizonte de médio prazo. Aplicações de realidade aumentada existem já disponíveis para smartphones.

No longo prazo, a computação baseada em gestos, ou seja, a interacção com equipamentos electrónicos através de gestos naturais é referida como uma tecnologia a ter em conta em futuras aplicações na área da educação. Estas aplicações terão sempre um campo de utilização muito específico. Este tipo de tecnologias já existe actualmente, destacando-se a consola de jogos Wii da Nintendo e também os ecrãs tácteis de muitos smartphones. A análise visual de dados respeita à interpretação visual de grandes quantidades de dados, descobrindo padrões, tirando partido de ferramentas de software de análise e dispositivos de visualização.

A edição de 2009 do Horizon Report destaca também outras tecnologias e tendências: a computação em nuvem (cloud computing) num horizonte de curto prazo (ou seja, algo que se perspectivava para estar em uso pleno em 2010, o que de certa forma se verifica), a personalização (horizonte de curto prazo) e as aplicações com tratamento semântico da informação (horizonte de longo prazo), ambas integradas na Web Semântica, e a georeferenciação (horizonte de médio prazo) que começa já ser vulgar em muitas aplicações, particularmente para smartphones.

Friday, June 11, 2010

E-learning 2.0: Ponto de Situação

É um facto assente que os educadores actuais reconhecem, em cada vez maior número, a importância das tecnologias nas actividades pedagógicas. Para além das potencialidades inerentes ao uso das ferramentas que a tecnologia proporciona está também presente a necessidade de adaptar as actividades pedagógicas às vivências da geração mais jovem, que ficou conhecida pela “net generation”. A convivência com a tecnologia não se restringe, no entanto, apenas aos indivíduos que nasceram quando o mundo desenvolvido já se encontrava imerso em tecnologia. A geração dos pais desses jovens, onde se incluem os seus educadores, e mesmo a geração anterior a essa, convive já regularmente com a tecnologia e com um mundo onde o acesso à informação é permanente.

O termo “e-learning”, apesar de muitas vezes conotado com o ensino à distância, não presencial, representa a utilização de diversas ferramentas tecnológicas no ensino, em particular, aquelas relacionadas com as tecnologias de informação e comunicação. Seja como auxiliar ao ensino tradicional presencial, seja em sistemas de ensino à distância, seja em sistemas mistos (blended), o e-learning é já indissociável do ensino.

As redes de comunicação, em particular a Internet, contribuem de forma significativa para as ferramentas ao dispor do ensino. A evolução da Internet, o surgimento da World Wide Web e, mais recentemente, o paradigma da Web 2.0, implicaram mudanças que tiveram particular impacto a nível social. Este efeito na sociedade afectou também os sistemas de ensino e os métodos pedagógicos. Na vertente tecnológica, o termo “e-learning 2.0” reflecte as mudanças introduzidas pela Web 2.0 no ensino assistido pelas tecnologias.

Um “mapa mental”, da autoria de George Siemens, procura fornecer uma visão de conjunto do e-learning:


Para lidar com a realidade introduzida pelo paradigma da Web 2.0, surgiram novas teorias de aprendizagem como o construtivismo social ou o conectivismo. O papel das ferramentas tradicionais de e-learning, os LMS, tem sido também analisado tendo em conta as ferramentas da Web 2.0. As mudanças sociais e tecnológicas tiveram também impacto na forma como ensino é visto. A aprendizagem já não é considerada apenas como um processo formal, controlado e limitado no tempo e espaço, mas algo que ocorre em diversas circunstâncias da vida das pessoas, que é fruto de fontes variadas e que tem de lidar com uma quantidade de informação que evolui rapidamente. A aprendizagem é omnipresente na vida do indivíduo e desenrola-se ao longo da sua vida (“anytime, anyplace, anywhere, for any reason”).

Dado que a informação deixou de ser um bem escasso, a dificuldade é agora saber gerir e filtrar a informação disponível. Mais importante do que o que se sabe é saber como chegar à informação e seleccionar a que é relevante com a consciência de que o prazo de validade dessa informação é cada vez mais curto. Na visão de George Simens, o saber como e o saber o quê estão a ser suplantados pelo saber onde (“know-how and know-what is being supplemented with know-where”).

O processo de aprendizagem, no contexto do e-learning 2.0, passa então a estar centrado no indivíduo, que possui maior controlo sobre esse processo. Os PLE e os e-portefolios são alguns dos lados visíveis deste novo processo. A aquisição de conhecimento resulta da interacção com comunidades, da aprendizagem entre pares e do contacto especialistas nas várias áreas de conhecimento. O processo tradicional em que o professor detinha e transmitia conhecimento, com os alunos a ser os receptores desse conhecimento, passa para um processo em que alunos e professores são produtores e consumidores de conhecimento. Esta forma de disseminar o conhecimento corresponde à visão da Web 2.0 como uma plataforma participativa e colaborativa de leitura e escrita (a read/write web). Tudo isto obriga a repensar o papel dos professores e o próprio conceito de sala de aula.

Apesar da mudança estar em curso, o seu impacto nos sistemas de ensino tradicionais ainda não é muito visível. Os investimentos feitos pelos estados e pelas instituições de ensino revelam-se mais a nível de equipamentos e infraestruturas do que nível dos currículos e processos de ensino. Existem várias experiências de aplicação das ferramentas do e-learning 2.0 mas muitas delas são ainda processos isolados e pontuais. Nem todos os educadores estão ainda conscientes das novas realidades. A iliteracia digital de muitos profissionais do ensino é uma barreira à adopção dos novos métodos pedagógicos que o e-learning 2.0 preconiza. Parte da sociedade actual vê ainda com alguma desconfiança as mudanças sociais que as tecnologias e a Web 2.0 têm introduzido. E algumas dessas preocupações poderão ser pertinentes. O prémio Nobel da literatura de 1998, José Saramago comentou, de forma crua, a utilização do Twitter (ver este post). A visão crítica de outros sectores da sociedade, sobre o uso e efeitos das tecnologias, deve ser encarada com objectividade e ponderação e ser usada como elemento moderador por todos aqueles que desenvolvem tecnologias e investigam a sua utilização nas várias áreas de actividade, onde o ensino é uma área particularmente sensível.